Como evitar a apropriação cultural?

por - dezembro 08, 2022


Um dos temas que me foi pedido no Instagram do Sob o Luar foi para falar sobre a apropriação cultural e como evitar a mesma na nossa prática. Antes de começar, vamos definir o que é apropriação cultural: 

Segundo Arnd Schneider (2003) a apropriação cultural é a adoção inadequada ou não reconhecida de um elemento ou elementos de uma cultura ou identidade por membros de outra cultura ou identidade. Isso pode ser controverso quando membros de uma cultura dominante se apropriam de culturas minoritárias.

Alguns exemplos de apropriação cultural são, por exemplo, os disfarces de "índios" que se vêm durante o Carnaval ou Halloween que são uma clara ofensa aos povos nativos-americanos. Ou a utilização do termo "smudging" para significar limpeza de um local, sendo que esse termo é exclusivo de tribos índígenas onde smudging não é apenas queimar ervas para limpar uma casa, mas todo um ritual específico dentro desta cultura. Existem diversos exemplos de apropriação cultural, de diversas culturas, que acabam por estar presente, infelizmente, em nosso redor. Contudo está no nosso poder (e dever!) garantir que não as propagamos e, aliás, que educamos as pessoas à nossa volta para não compactuar nestes comportamentos. 

É também importante distinguir que existem diferenças entre o termo de "apropriação cultural" e o termo "prática fechada". Uma prática fechada é, por norma, uma prática que requer iniciação dentro da mesma e que não pode ser praticada fora desses grupos ou tradições. Não quer dizer que a pessoa X ou Y não a possa praticar mas, para o fazer, terá de ir ter com esses grupos, introduzir-se nas suas culturas, socializar, conhecer as pessoas e, se o grupo em causar a aceitar, então aí tratar desse processo. 

Agora, a grande questão: Como evitar praticar apropriação cultural? 

Acima de tudo entendendo de onde vêm as coisas que estamos a praticar. Quando estamos a aprender sobre Bruxaria e Paganismo e vemos algo que gostaríamos de incorporar na nossa prática é essencial investigar sobre esse assunto e, acima de tudo, entender as suas origens (e, dessa forma, acabamos por entender também o seu funcionamento). Obviamente que uma prática que seja comum em todo o espaço europeu não vai ser um caso que possa ser apropriado culturalmente porque faz parte da cultura de todo um continente que possui um papel dominante na sociedade ocidental. Ou uma prática que seja de uma cultura morta (como Antigo Egipto ou Roma Antiga), porque não há uma cultura minoritária a ser afetada, porque a mesma já não existe há milhares de anos (ao contrário do que muitos grupos nacionalistas dentro das comunidades possam tentar alegar). Mas se calhar, se for uma prática de uma tribo indígena sul-americana já se trata de uma apropriação cultural, principalmente se essa cultura for abertamente contra essa prática (que é o caso de algumas práticas africanas ou de tribos indígenas brasileiras que se vêm apropriadas). 

Esta é, sem dúvida, uma área na qual é preciso trabalho ativo. Não há forma de ter uma lista com todas as coisas que não podem ser apropriadas culturalmente porque isso seria impossível. É preciso ler e investigar o assunto (O google é uma excelente ferramenta o TikTok/Tumblr nem por isso) e ver, acima de tudo, testemunhos de pessoas que fazem parte das culturas afetadas para entender o feedback delas. Em caso de dúvida, podemos sempre participar em comunidades online e questionar os outros para tentar aprender (principalmente questionar pessoas dessas culturas porque não é alguém como eu - branca e europeia - que vos vai conseguir falar em nome de uma cultura à qual eu não pertenço). E em caso da dúvida se manter, podemos sempre abster-nos de certas práticas ou, melhor ainda, substitui-las por coisas mais perto de casa! Por exemplo, voltando ao caso do smudging: Ao invés de querermos queimar sálvia branca ou palo santo (que são duas plantas que estão a ser exploradas em excesso ao ponto de estarem em risco e, também, utilizadas originalmente por povos nativo-americanos) para limpar a casa porque não usarmos plantas locais de Portugal? Temos o alecrim, a arruda e a sálvia comum que fazem exatamente o mesmo papel e são plantas presentes no nosso ecossistema local. Não só estamos a evitar sobre-exploração de uma planta, evitar apropriação cultural como ainda estamos a conectar-nos com a nossa flora local, utilizando plantas nativas da zona onde vivemos. 

Por fim, gostava de recomendar um artigo (em inglês) que li sobre a temática: "Cancelled for Renovations: More Thoughts on Closed Practices". Espero ter ajudado a esclarecer um pouco mais este tópico e sintam-se à vontade para dar as vossas opiniões (respeitosas, porque qualquer comentário extremista nem será aceite) nos comentários! 

Nota: Um agradecimento especial à Sininho que me ajudou a rever este texto! :) 

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